Síndrome de Ulisses

Muitas pessoas a confundem com um diagnóstico médico, mas não é bem assim. Leia para saber!

MIGRAÇÃO

Gustavo Pedroso | CRP 08/37370

2/2/20242 min ler

A Síndrome de Ulisses, por vezes chamada síndrome do imigrante com estresse múltiplo e crônico, é descrita pelo Dr. Joseba Achotegui – psiquiatra responsável por sua primeira caracterização – como um quadro de extremo estresse. De acordo com Achotegui, a Síndrome de Ulisses não é um transtorno mental ou um diagnóstico médico, mas um conjunto de sintomas psicológicos (emocionais e físicos) que se desenvolvem como reações às perdas causadas pelo deslocamento geográfico. 

O nome deste quadro emocional faz referência ao personagem Ulisses do poema épico grego Odisséia, de Homero. Este herói clássico passa vinte anos longe de sua casa, a ilha de Ítaca, para lutar — a contragosto — na guerra de Tróia; sendo o poema uma descrição das adversidades que teve de enfrentar para enfim retornar para sua mulher, Penélope, seu filho, Telêmaco, e seu pai, Laertes. 

A Síndrome de Ulisses é caracterizada, assim, como um quadro de lutos múltiplos e complicados (isto é, de difícil elaboração). Achotegui chega a enumerar os sete maiores lutos da migração, como traços da síndrome: 

  1. Luto pela separação da família e entes queridos;

  2. Luto pela perda da língua;

  3. Luto pela perda da cultura;

  4. Luto pela perda da terra;

  5. Luto pela mudança do status social;

  6. Luto pela perda do contato com o grupo ao qual pertencia;

  7. Luto pela perda de segurança e pelos riscos à integridade da pessoa.

Essas sete categorias de luto podem fazer parte de qualquer migração e não necessariamente produzem sofrimento excessivo para aqueles que migram. Contudo, um luto pode se tornar complicado e gerar sintomas psicológicos quando existem dificuldades para elaboração das perdas — como a não possibilidade de falar sobre o que se perdeu, de encontrar semelhantes que passaram pelo mesmo processo, a falta de tempo para elaboração, entre vários outros aspectos.

Ainda de acordo com Achotegui, a dificuldade na elaboração dessas perdas pode produzir sintomas psicológicos, tais como quadros de ansiedade e angústia, tristeza excessiva associada a culpa e sentimentos de fracasso e, até, dores de cabeça e fadiga extrema.  

Assim, entendemos que a Síndrome de Ulisses é um termo criado para jogar luz e trazer importância às dificuldades sociais e emocionais daqueles que imigram (sejam estes expatriados, intercambistas, imigrantes humanitários ou refugiados). É necessário, contudo, ir além dessa grande categoria e procurar compreender como cada pessoa se sente e se comporta frente a transição de país, cultura e língua. É aí que a psicoterapia encontra sua grande importância, como possibilidade de reconhecer no caso a caso o que se perdeu ao migrar, possibilitando o luto e a construção de uma nova vida no lugar que se escolheu viver e trabalhar.

Essa travessia não precisa ser solitária, vamos juntos?